O sucesso nas bilheterias nem sempre depende
da qualidade do filme, mas na maioria das vezes, das ações de marketing
envolvidas no seu lançamento. Podemos comprovar isto dando uma breve olhada na
lista das dez maiores bilheterias de todos os tempos. Por lá encontram-se pérolas
como “Alice no País das Maravilhas” e
“Transformers”, filmes que não são
grandes exemplos de cinema, mas vieram acompanhados de massivas campanhas para
encher as salas e que alcançaram seus objetivos. O meu com este texto é
discutir justamente o oposto, quando ótimos filmes não conquistam a bilheteria
esperada por terem sido sabotados pelos seus distribuidores.
As distribuidoras brasileiras tem uma tarefa
árdua, e são muitas vezes alvo de ataques infundados por nós, cinéfilos. Pense
bem, elas tem de adquirir um produto (o filme), com base no feeling de algumas
pessoas ou no burburinho que ele está causando, apostando que o investimento
pesado que inclui a divulgação e a distribuição em si, além do próprio custo de
compra, dará retorno. Quando elas adquirem um filme, e tempos depois não
consideram que seu lançamento seja rentável, ele aparece direto em vídeo para evitar maiores prejuízos. Ou,
quando querem lançar um filme importante, mas ainda assim não acreditam
plenamente no potencial dele, elas utilizam de uma tática que eu costumo chamar
de CANALHICE. A canalhice em questão aqui provém da Paris Filmes. Ela não é a
única que faz este tipo de coisa, mas coincidentemente (ou não), os três casos
que me motivaram a escrever este texto, são de sua responsabilidade.
Duas obras têm muito em comum. Estrearam ano
passado nos Estados Unidos, suas protagonistas concorreram ao Oscar deste ano e
são ótimos dramas repletos de sofrimento e beleza. Falo de “Blue Valentine” e “Rabbit Hole”. Não pense que vou reclamar por terem estreado por
aqui com média de CINCO meses de atraso. A isso já estamos todos acostumados e apesar
de não gostar, até entendo. O selinho do Oscar no pôster de um filme sempre
atrai público. O que está em questão é justamente a necessária campanha de
marketing.
Blue Valentine é um filme
sobre o fim do amor. Vemos o início e o término de um relacionamento, que se
desgasta ao longo de anos, com repetidas brigas e ofensas. Um trabalho
fantástico que reúne roteiro, montagem, direção e atuações primorosas, sem esquecer-se
da trilha sonora que até hoje não parei de ouvir. Daqueles que você sai da sala
de cinema com um gosto amargo na garganta, mas que cada vez que se lembra do
filme, gosta mais dele. E aí me vem a Paris Filmes e faz uma grande campanha
para lançar o filme no DIA DOS NAMORADOS. O título, que em uma tradução livre
seria algo como “Namoro Triste”, se transforma em “Namorados para Sempre”. O que se consegue com isso? Uma sala de
cinema cheia no dia dos namorados, repleta de casais adolescentes, em que a menina
espera ver mais um romance chinfrim no naipe de “Um Amor para Recordar” e o rapaz, coitado, foi arrastado até ali.
Ele acaba dormindo, e ela sai desolada com o choque da realidade a que foi
apresentada, dizendo para todas as amigas que o filme é péssimo. Na semana
seguinte Blue Valentine viu sua
bilheteria diminuir em 60%, e não sobreviveu até a outra sexta-feira.
Rabbit Hole, ou em tradução
livre “Toca do Coelho” (uma metáfora utilizada no filme), é sobre a dor da
perda de um filho. É Nicole Kidman chorando freneticamente do início ao fim do
longa, nos mostrando que sobreviveu a todas as plásticas e ainda é uma baita
atriz, acompanhada do soberbo Aaron Eckart. Tocante e contido, é quase um
estudo sobre o luto. O título em português? "Reencontrando a Felicidade". A de
quem eu não sei. Rabbit Hole
arrecadou míseros R$159.000,00 no Brasil.
Juro que tento entender, mas é difícil. O
motivo para isso seria porque são diretores desconhecidos do grande público?
Porque são filmes pesados de drama que precisam de um incentivo? Então lhe
apresento o terceiro exemplo. Uma comédia, de um diretor renomado como Woody
Allen, que por si só já atrai milhares de cinéfilos, com um pôster lindíssimo
que brinca com uma tela de Van Gogh. Nem com tudo isso, “Meia Noite em Paris” (enfim uma tradução correta) saiu livre. Esse
pôster mequetrefe aqui ao lado foi o utilizado no país. Aí eu ouço, na fila
do cinema, dois casais conversando. Uma moça dizendo para outra que a
obra-prima de Allen era péssima. Ao ser indagada do porque, respondeu: “Olha o
pôster! Achei que fosse um romance e era uma comédia ‘toda louca’.” Felizmente
a primorosa loucura não foi afetada, e é a maior bilheteria do diretor no
Brasil desde sempre. Daqueles casos em que a qualidade do filme prevalece a uma
tentativa de sabotagem.
Talvez nossas distribuidoras não saibam, mas
uma das formas de marketing mais efetiva é o buzzmarketing, ou o famoso boca a boca. Conseguir levar o público a
sala de cinema em primeira instância, ludibriado, ao invés de alavancar a
bilheteria pode fazê-la murchar. Se o público alvo de um filme é um, não adianta tentar conquistar os demais em cima de uma farsa.
Sonho com o dia em que os títulos de filmes
sejam mantidos no original, ou ao menos que se façam traduções que mantenham os
significados que seus autores pretendiam. Só assim poderemos nos ver livres de
filmes como “Annie Hall” virando “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” em
busca de um duvidoso "sucesso".